Esse texto é uma homenagem a Jefferson Magno Costa
Olha, eu confesso. Primeiro eu usei a religião, estava já à mão, eu tinha fácil em casa, depois a Filosofia, depois a Ciência e durante todo o processo a Poesia. Passeei por caminhos tortuosos, pela política, pela música, pelo teatro, por outras artes, pelas explicações agnósticas, pelas teorias, pelas conversas de bar, crenças antigas, tradições, por uma ou outra face da cultura. Mas eu juro: nunca usei antidepressivos, nem usei (todas) as outras drogas! Essas eram tentativas, vãs, de sanar minha obsessão por encontrar respostas.
Eu fui escrevendo, escrevendo, escrevendo pra ver se a dor sumia, se a garganta seca, a vontade de perguntar passava, tentava pensar em outra coisa, ou melhor, tentava não pensar em nada, mas eu virava noites em claro, repassando uma frase que li, ou avaliando o filme que assisti. Por muitas vezes eu ouvi dizerem que eu estava ficando louca, ou que eu era dramática, ou que fazia aquilo pra chamar atenção. Poucas pessoas realmente entendiam que eu sofria muito por dentro, e ainda sofro.
Por que uns vão ouvir que não podem ter filhos e vão superar, eu vou reviver isso todo dia, o tempo todo. Uns vão ser expulsos da Igreja e vão ridicularizar a denominação, eu vou lamentar até que ponto chegou essa instituição (E eu lamento mesmo, profundamente). Uns vão se casar, ter seu emprego, ir a Igreja no domingo. Eu vou ficar na olaria, passando por mais e mais reparos. E como eu invejo uma vida, humilde, desproposital, como a de algumas meninas da minha idade que dormem ás dez e meia e acordam cedo pra ir trabalhar. Eu passo noites em claro, há 10 anos. Falando nisso, fico rindo dos pastores da iurd que pregam na madrugada, por que dos problemas que eles relatam, eu devo ter 80% (risos, muitos). Eu não tenho a audácia de pregar um Gezuz que tire como num passo de mágica, uma pessoa das dívidas, da depressão, do desemprego, a troco de uma visita na igreja, ou a troco de um toque nos 348, 368, sei lá. Eu não desperdiço nenhum copo d’água com isso.
Não posso pregar o que não vivo e o que eu vivo é o processo, etapa por etapa! Eu estou sofrendo, cada vez que a lixa do marceneiro passa. Eu estou remoendo meus erros na construção de um futuro mais coerente pra mim. Estou imitando Cristo, um pouco mais a cada dia, caindo no velho erro de vez em quando, me arrependendo, levantando, assim por diante. Fico fascinada com as histórias do tipo ‘dormi drogado e acordei crente’. Mas não é assim comigo. Eu sofro e reflito em cada desafio. Deito no chão da Igreja no meio do louvor, ligo pra pessoas ás 2 da manhã pra pedir perdão. Faço sessões de terapia em bancos de ônibus e choro 3 dias por causa de uma criança que vi pedindo esmola no centro da cidade. E pouco me importa se minha unha está com esmalte velho, pela metade ou se repeti o mesmo vestido nos últimos 5 casamentos. Eu visito meus tios, dias de terça á tarde. Prefiro a compania de crianças de 11 anos do que de pessoas que conheço há 11 anos. Pesquiso sobre formas de economizar água e coloco em prática. Dou aulas de reforço escolar de graça, escondido do meu marido.
Veja bem, não torno tudo isso público pra ouvir comentários me dizendo que sou isso, ou aquilo. Só eu sei o quanto me dói ser assim, só eu sei quantos kilos já engordei nas minhas sessões da madrugada a fora. Só eu sei quanto tem na minha carteira pra pagar a coca-cola que quero beber agora – nada. Só eu sei o que me custa me submeter ás ordens de um líder sem questionar, por que dessa vez eu quero fazer dar certo. Só eu sei o que é ouvir que devo aceitar que meu marido é o cabeça, quando às vezes penso, que ele deve estar mais pra cabeça de alho. E isso, nós sabemos, têm multidões de implicações. Eu sei o quanto me custa ter em meu currículo um longo histórico de problemas com patrões, professores, orientadores, entre outras autoridades. Eu sei o peso que tem meu sobrenome, o peso que tem meu passado, o peso que tem minha figura pública e o pré-conceito que muitos formaram ao meu respeito. Eu sei quem sou. Ou não sei quem sou? Eu sempre me perco quando o assunto é esse!
Gostaria tanto de acreditar que sou um macaco, menos macaco que o ser evolutivo anterior na cadeia. Ou que sou uma alma sendo reciclada em outro corpo, com ainda milhões de chances. Seria tão mais fácil... mas não acredito! E la´vou eu lidar com todas essas minhas características-bomba hoje mesmo, agora. Ora leio Clarisse e me sinto mais confortável, ora leio Fernando e me sinto mais deprê. Me identifico com um, me diferencio de outro. Mas minha ajuda vem mesmo quando estou em oração. É conversando com meu Pai que vou aprendendo um pouco mais sobre mim. Sei que eu sou, no mínimo, uma pessoa excêntrica. Que ás vezes minha profundidade soa como abismo para muitos. De lá me apego à Deus com todas as minhas forças. Sou mesmo carente, dramática, complexa, bipolar, guerreira. Aberta, mas às vezes arredia. Amorosa, mas ás vezes cruel... Intensa. Intensa até demais. Como diria Nietzsche vou 'procurando razão na loucura' todos os dias. Como disse no começo, vou escrevendo pra ver se a dor passa. Que dor? a dor de ser como eu sou. Sinto que existe muita poesia nisso, será? Não sei. Mas respeito ainda mais os poetas, se eles são assim como eu.
Estranha excentricidade.
ResponderExcluirPrefiro viver com essa dor do que virar as costas para a vida e ignorar a verdade.
Se eu acho difícil conviver com isso? Tenho é receio de imaginar o que Jesus realmente sentiu.
É sim. Não tenha dúvidas: Você é poetisa sim. E muitíssimo obrigado por ter-me dedicado essa pérola (entre tantas de sua coleção postada no seu blog) de auto-análise psicológica fina, aguda, cortante, desvendante, proustiana, kafkaniana, dostoiésvkiana, claricelispectoriana (e tantas outras anas que, se eu fosse citar aqui, não caberiam em todo esse infinito cyber espaço).
ResponderExcluirParabéns pelo exercício do seu excepcional talento analítico-poético. Nunca será demais repetir que a literatura evangélica realmente necessita de escritoras talentosas, cultas, perspicazes e sensíveis como a irmã. ESCRITORAS QUE ESCREVAM LIVROS. Concentre, se possível, esforços e tempo nessa direção. E prepare-se para enriquecer, cultural e espiritualmente, milhares de pessoas em nosso país, e colher muitos frutos.
Mais uma vez, obrigado por ter-me homenageado com seu artigo excepcional. E obrigado por tê-lo ilustrado com uma foto minha (Caramba! Eu a estava procurando há uns dez anos. Onde a encontrou? No álbum de fotografias da família do tio Charles Darwin?). A cor azul me caiu muito bem. E eu nunca havia notado que tinha um nariz tão charmoso, e uma cabeleira tão sedosa (mesmo sem banho, que eu não tomo há uns oito anos).
Ps: Vou postar no meu blog uma resposta ao seu comentário (sem as brincadeiras que escrevi aqui, é claro!).
Lindo, sensível, humano-divino e sem sombra de dúvida: POÉTICO.
ResponderExcluirPS! Vim retribuir a visita no meu blog e tive essa grata surpresa (já estou seguindo e prometo voltar para ler mais coisas)
Bjs
Roberta (www.meninasdoreino.com)